“O Telefone Preto” é tenso mesmo com poucos sustos

Publicado em 20/07/2022

Depois de se
desentender com a Marvel por “diferenças criativas” na condução de
“Doutor Estranho no Multiverso da Loucura” e de ser substituído por
Sam Raimi, Scott Derrickson retorna ao gênero do terror. Sem o bafo puritano da
Disney em seu cangote, o diretor volta a tratar de temas sinistros, com direito
a sangue e palavrões.

“O
Exorcismo de Emily Rose”, longa de estreia de Derrickson, era uma mistura
irregular de “Law & Order” com “O Exorcista”, pendendo
mais para o drama jurídico do que para a possessão demoníaca. “A
Entidade”, no entanto, impressionou fãs de terror com cenas perturbadoras,
ainda que o filme desafie a lógica aqui e ali.

Em “O
Telefone Preto”, que estreia nos cinemas, Derrickson trabalha novamente
com o ator Ethan Hawke. Desta vez, Hawke é um vilão conhecido apenas como
“o sequestrador” -um apelido genérico para um antagonista dramático-
que aterroriza os meninos de um subúrbio já forrado com cartazes de crianças
desaparecidas.

Interpretado
por Mason Thames, Finney é o típico garoto inteligente que sofre bullying na
escola. Sua carismática irmã Gwen, muito bem encarnada por Madeleine McGraw,
tem sonhos que revelam detalhes dos sequestros -o que desperta a ira do pai
vivido por Jeremy Davies, um bêbado que não aceita que a filha tenha poderes
paranormais.

No caminho
de casa, Finney se depara com um mágico de festa infantil que derruba as
compras do mercado ao lado de uma suspeita van preta -e, claro, acaba raptado.
Os sonhos de Gwen serão imprescindíveis para encontrar pistas de sua
localização, mas o menino também contará com uma ajudinha sobrenatural para
escapar do cativeiro.

A combinação
de crianças desaparecidas, bullying, alcoolismo e mediunidade pode parecer
bastante familiar. “O Telefone Preto” é baseado em um conto de Joe
Hill, filho de Stephen King -que, apesar de não adotar o sobrenome famoso,
parece ter se inspirado nas obras mais celebradas de seu pai, como “It: A
Coisa”, “Carrie, a Estranha” e “O Iluminado”.

Desde 2017,
quando a refilmagem de “It: A Coisa” arrebatou mais de US$ 700
milhões na bilheteria, várias outras obras de King foram ressuscitadas, como o
recente “Chamas da Vingança”. A série “Stranger Things”
comprovou que nem é preciso ir direto à fonte -emular o estilo do autor americano
já é suficiente para atrair a atenção do público.

Assim,
“O Telefone Preto” faz uma aposta segura na nostalgia, tão
predominante no ramo do entretenimento com a ascensão da cultura nerd nas
últimas décadas. É inevitável a sensação de déjà-vu ao ver uma menina com um
casaco de chuva amarelo pedalando numa rua pacata. Até as bexigas -pretas, não
vermelhas- fazem parte da trama.

Produzido
pela Blumhouse, “O Telefone Preto” custou por volta de US$ 18 milhões
e já faturou mais de US$ 100 milhões na bilheteria mundial, uma vitória
discutível para um filme que não faz parte de uma franquia, mas que é produto
do zeitgeist. Mesmo sem arriscar, o novo terror de Derrickson é brutal no
retrato de uma infância cheia de tormentos.

Entre surras
de cinto dentro da própria casa e os valentões da escola que não se contentam
com um soco ou dois, parece que o sequestrador não é a única ameaça da cidade.
Um dos amigos de Finney diz a ele que, cedo ou tarde, ele precisará aprender a
se defender. Não há inocência a ser corrompida, as crianças já vivem em um
pesadelo.

Há alguns
sustos baratos que causam solavanco no espectador -mais pelo barulho do que por
alguma imagem horripilante. “O Telefone Preto” nos envolve quando
abandona essas táticas batidas e se concentra nas emoções dos personagens. Uma
jovem atriz para se acompanhar, McGraw é excelente como Gwen, o verdadeiro
coração do filme.

É por meio
dos sonhos dela que Derrickson humaniza os meninos raptados antes de Finney.
Dentro do gênero do “true crime”, há um culto perverso que endeusa
serial killers como Ted Bundy ou John Wayne Gaycy. Em vez de tratar os mortos
como vítimas anônimas, “O Telefone Preto” segue pelo caminho inverso.

 

O TELEFONE
PRETO

Quando
Estreia nesta quinta (21), nos cinemas

Classificação
16 anos

Autor Ethan
Hawke, Mason Thames e Madeleine McGraw

Produção
EUA, 2021

Direção
Scott Derrickson

Avaliação
Bom


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