O dia em que o imperador do Brasil visitou Belém
Publicado em 15/09/2024
A região que hoje é marcada pela presença da Estação das Docas já foi palco, há mais de 150 anos, para a rápida visita realizada pelo então Imperador do Brasil, Dom Pedro II, a terras belenenses. A bordo de um navio a vapor que navegava sob as águas da baía do Guajará, Dom Pedro II e a imperatriz Thereza Christina aportaram no antigo cais do Porto, às 5h30 do dia 05 de abril de 1876, marcando a história do território que, à época, ainda atendia pelo título de Província do Grão-Pará.
Na segunda metade do século XIX, a capital paraense era uma cidade muito pequena, marcada pela presença de animais que circulavam pelas ruas, mas que, sobretudo, se destacava pela efervescência econômica proporcionada pela exploração da borracha. Apesar de ainda manter uma relação muito próxima à imagem do Imperador à época, Belém já experimentava a circulação de ideais republicanos, o que preocupava a Monarquia. Por esse conjunto de elementos, a cidade já despertava certo interesse de visitação por parte do então Imperador Pedro II.
Apesar disso, a tal visita que marcou a história da capital chegou a ser adiada, antes de se concretizar em abril de 1876. “Aqui era uma espécie de Brasil verde, o qual o Imperador não conhecia, então, ele tinha a intenção de vir como viajante, como pesquisador. Se hoje em dia nós ainda vemos pessoas com aquele pensamento de que a vida aqui é exótica, faça ideia há mais de 150 anos atrás”, considera o historiador Márcio Neco. “Então, o Imperador tinha muita vontade de vir à região e começou a projetar essa vinda para cá em meados de 1866”.
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A perspectiva de que o Imperador do Brasil fizesse uma visita a Belém mobilizou diferentes atores sociais da cidade. O professor Márcio Neco conta que houve uma intensa mobilização na capital paraense, que foi preparada para receber Pedro II. Ruas foram limpas, animais foram recolhidos e até mesmo um arco, aos moldes do Arco do Triunfo de Paris, chegou a ser montado às margens da Baía do Guajará para receber o Imperador. Porém, essa primeira visita foi frustrada. “Foram contratados, artistas, tipógrafos, fotógrafos para virem aqui e mobilizar as coisas e nesses preparativos foi construído um arco que o fotógrafo Felipe Fidanza registra e essa fotografia é enviada para eles para seduzir, sobretudo, a Imperatriz a vir a Belém”.
O professor explica que o que se sabe é que o arco foi montado na região que, à época, compreendia o Cais do Porto e que hoje é ocupada por construções como a Estação das Docas. Além disso, a própria avenida que hoje é chamada de Boulevard Castilhos França prestava homenagem a Pedro II, sendo chamada à época de Rua do Imperador. Apesar de todo esse preparativo, por questões de saúde, a família imperial não vem a Belém naquele primeiro momento e tudo foi desmontado, incluindo o pórtico. “Houve, então, uma grande frustração na cidade porque a população queria ver o seu Imperador. Ele era uma figura muito valorizada. Para se ter uma ideia, no Rio de Janeiro, por exemplo, existia a figura do ‘beija-mão’, quando as pessoas se reuniam para entrar onde ele vivia e beijar a mão do Imperador”, contextualiza.
“Então, houve frustração e as pessoas com ideais republicanos vão aproveitar-se disso para criticar ainda mais a Monarquia. A visita do Imperador a Belém era estratégica justamente por aqui ser uma cidade em que a presença dele poderia combater essas ideias republicanas que estavam já muito presentes. Esse cenário se deu 20 anos antes da Proclamação da República, então, os ideais republicanos já eram fortes”.
Foi apenas 10 anos mais tarde, em abril de 1876, que o Imperador, enfim, pisou em solo paraense. Ele seguia viagem rumo aos Estados Unidos, em busca de tratamento de saúde para sua filha, quando decidiu fazer uma parada em Belém, adentrando a Baía do Guajará. “Nesse dia, 04 de abril, não é possível atracar, eram 18h. Mas vai haver de novo a mobilização, os comerciantes vão enfeitar as ruas, vai haver convocação do povo e às 5h30 do dia 05 de abril de 1876, Dom Pedro vai descer, aportar em Belém”.
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Além do receptivo às margens da Baía, o Imperador também recebe homenagens da então Assembleia Legislativa da Província do Grão-Pará e percorre algumas ruas da cidade, sobretudo aquelas que faziam alusão à família. O professor destaca que Dom Pedro passou pela então Rua do Imperador, atual Boulevard Castilhos França; pela então Rua da Imperatriz, hoje rua 15 de Novembro; pela antiga rua 02 de dezembro, que prestava homenagem ao aniversário do Imperador e que hoje é chamada avenida Generalíssimo Deodoro. Outra referência feita a ele pela Belém do século XIX era a antiga Estrada de São José, hoje avenida 16 de Novembro, que tinha a paisagem marcada por uma fileira de palmeiras imperiais.
“Após a Proclamação da República os nomes dessas vias foram modificados na tentativa de gerar um apagamento dessa memória da Monarquia. No Brasil inteiro se entende que é necessário abolir tudo aquilo que fizesse referência à Monarquia porque algumas pessoas ainda tinham uma grande predileção, um grande carinho pela Monarquia”, explica Márcio Neco. “Aqui vai haver debates na Câmara porque alguns vão defender a importância do Dom Pedro I e de Dom Pedro II, da Imperatriz que era considerada uma mãe para muitas pessoas e vão permanecer alguns nomes de ruas, mas a maioria vai sofrer realmente um processo de apagamento por parte dos Republicanos quando eles assumem”.
Além das vias públicas, Dom Pedro II visitou a Igreja de Sant’Ana, onde eram celebradas as missas em alusão à família imperial; o antigo Palácio do Governo, que hoje abriga o Museu Histórico do Estado do Pará (MHEP); além do Arsenal de Marinha. Apesar da rápida visita, que durou apenas um dia, a presença daquele que foi o último imperador do Brasil em terras paraenses ficou marcada na história da cidade. “A Imperatriz faz um álbum de fotografias com as fotos registradas aqui, eles vão gostar muito daqui, mas a presença deles aqui é muito breve. Mas a presença do Dom Pedro aqui, por mais que tenha sido só por um dia, vai impactar muito a cidade na época”, conclui Márcio Neco.
ARCO
l Posteriormente desmontado, o arco construído para receber o Imperador Pedro II e a Imperatriz Thereza Christina foi registrado pelo fotógrafo Felipe Augusto Fidanza. As fotos integram o conjunto de cerca de 23 mil fotografias que integravam a biblioteca particular do Imperador e que foram doadas por ele, em testamento, para a Biblioteca Nacional. Hoje, as fotos integram o acervo da Biblioteca Nacional como parte da coleção denominada “Collecção D. Thereza Christina Maria”, em homenagem à Imperatriz.
Com informações de: Biblioteca Nacional Digital. Disponível em bndigital.bn.gov.br