PCT Guamá reúne ciência, tecnologia e inovação na Amazônia
Publicado Diário FMem 02/02/2025
Rodeado pelo verde das árvores que ainda caracterizam a região, a estrutura instalada na avenida Perimetral, em Belém, guarda um dos principais polos de pesquisa aplicada do país, o Parque de Ciência e Tecnologia (PCT) Guamá. Reunindo laboratórios e pesquisadores vinculados à Universidade Federal do Pará (UFPA), à Universidade Federal Rural da Amazônia (Ufra) e à Universidade do Estado do Pará (Uepa), o parque mantido pelo Governo do Pará não apenas desenvolve pesquisa, como também promove a prestação de serviços à indústria e, consequentemente, à sociedade.
Quem passa na avenida Perimetral pode não imaginar, mas em cada andar dos prédios que compõem o PCT Guamá, dezenas de pesquisadores e cientistas atuam diariamente para integrar ciência, tecnologia e inovação sustentável. Em muitos casos, as soluções desenvolvidas dentro dos laboratórios, chegam diretamente à população através de soluções que garantem desde a melhor qualidade de produtos, até soluções que promovam o desenvolvimento sustentável.
Entre os focos da atuação do Centro de Valorização de Compostos Bioativos da Amazônia (CVACBA), laboratório vinculado à UFPA e que é residente do PCT Guamá, estão, além do mel, frutos que são velhos conhecidos da população paraense, como o açaí e o cacau. O coordenador do CVACBA, professor Jesus Souza, explica que o centro de pesquisa é composto por 10 professores – 9 da UFPA e um da Ufra – que atuam em diferentes linhas de pesquisa, mas que objetivam valorizar compostos bioativos da Amazônia, com foco na sustentabilidade e na transferibilidade de tecnologia para pequenos e médios produtores ou empresas. “O foco principal do laboratório são as cadeias produtivas de frutas”.
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Na cadeia do cacau, o professor explica que o laboratório atua desde o incentivo à produção sustentável, no caso da implantação dos Sistemas Agroflorestais como forma de valorizar o meio ambiente, até o incentivo a indústrias ou empresas que produzem chocolates e derivados.
“Hoje, o Pará é o maior produtor de cacau do Brasil e o cacau é originário da Amazônia, então, a gente precisa trazer isso para o nosso público e, com isso, incentivar o consumo de cacau e de derivados que a gente já sabe, através das nossas pesquisas e de outras, que são muito bons para a saúde, com propriedades que previnem doenças cardiovasculares”.
Além da produção do chocolate em si, as pesquisas com o cacau também buscam valorizar os resíduos que seriam descartados. Jesus Souza explica que aproximadamente 70% do cacau é formado por casca, um produto que costuma ser subutilizado.
“Muitas vezes o produtor quebra, lá no meio da plantação, e vai deixar por lá para servir de adubo. Mas a gente tem trabalhado em buscar valorizar essas cascas porque elas também têm muitos benefícios para a produção de pectina, para a produção de ração animal, para a produção de cogumelos comestíveis, por exemplo. Então, tem várias utilizações para esse resíduo que hoje não é muito valorizado, mas que pode ser uma fonte de renda para os produtores de cacau”.
AÇAÍ
Em outra frente, os pesquisadores do CVACBA também pesquisam e buscam desenvolver melhorias produtivas na cadeia do açaí. O fruto, inclusive, foi o primeiro a ser trabalhado pela equipe, quando o grupo começou a se formar ainda em 1994. “Primeiro, veio o conhecimento do açaí, a parte de composição, a parte de bioativos, e foi a partir dessas pesquisas que o açaí começou a ganhar notoriedade. Começou-se a perceber que, além de ser gostoso, ele é bom para a saúde”, explica o professor.
“Hoje, a gente tem análises específicas como, por exemplo, a avaliação de contaminação pelo vetor causador da Doença de Chagas. Nós fazemos análise para verificar se o açaí tem ou não esse micro-organismo e isso é importante porque a gente sabe que se a pessoa consome açaí contaminado com o protozoário isso vai gerar a doença”.
Outra linha de pesquisa está ligada, por exemplo, ao desenvolvimento de estudos que possam gerar uma polpa de açaí com percentual menor de água, visando a redução dos custos de transporte para a exportação. Assim como o cacau, os resíduos gerados pelo açaí também apresentam um enorme potencial de utilização pela indústria e também são objetos de pesquisa pelo laboratório.
“Muitos dos trabalhos da utilização dos caroços de açaí são para a queima em caldeiras nas indústrias, mas eles têm um potencial muito maior do que isso. Tem empresas que fazem grãos de açaí torrado e moído, e nós trabalhamos na verificação e na implantação da legislação junto à Adepará, por exemplo”.
SERVIÇO
Algumas das pesquisas realizadas no centro já são aplicadas por algumas empresas, outras ainda estão em desenvolvimento para que possam ser, de fato, implementadas. Essa prestação de serviço, inclusive, é um dos pontos fortes de atuação do laboratório, que realiza o que se conhece como controle de qualidade.
Demandado pelas indústrias, o laboratório pode avaliar produtos alimentícios de uma maneira geral, onde será analisada a composição do produto; como também desenvolver novos produtos sob demanda das empresas para que eles possam, posteriormente, implementá-los.
Além disso, o professor destaca o incentivo ao desenvolvimento de startups nessas áreas. “Nós incentivamos o desenvolvimento dos nossos egressos ou de outras pessoas que têm as ideias e que querem desenvolver produtos ou serviços. A gente estimula que eles possam passar um tempo com o suporte do laboratório para que eles comecem a desenvolver os seus produtos e depois saiam para o mercado”.
ÓLEOS
Em outro andar do mesmo prédio, a integração entre a ciência e as demandas do mercado também toma a atenção de pesquisadores e cientistas. No Laboratório de Óleos da Amazônia (LOA), vinculado à UFPA, as pesquisas são desenvolvidas com base nas plantas oleaginosas, especialmente as amazônicas, e toda a sua cadeia de produção desde o controle do óleo, até o aproveitamento dos subprodutos ou resíduos.
O professor da UFPA e coordenador do laboratório, Emerson Costa, explica que os óleos podem ser obtidos desde a polpa dessas oleaginosas, até das amêndoas como é o caso do Murumuru, da Castanha-do-pará, do Patauá, do Inajá, do Babaçu e do Buriti. “Essas plantas oleaginosas têm o seu uso descrito na literatura desde os povos originários, na sua utilização como alimento, como proteção contra insetos, para pintura, para o cabelo, para a pele. Mas, de uma década e meia para cá, elas vêm sendo utilizadas muito na área de cosméticos”.
Como boa parte dessas oleaginosas são extrativistas, o professor destaca que há uma forte ligação entre os povos originários e essa bioeconomia, uma relação que leva à valorização da floresta em pé. “A Amazônia tem um potencial gigantesco para essas oleaginosas e um dos apelos é justamente valorizar a diversidade dessas oleaginosas na floresta e, com isso, valorizar a floresta em pé. Você traz um benefício econômico para os povos originários que usufruem da floresta e mantém a preservação”.
Tendo essa preocupação em mente, o que se busca é desenvolver pesquisas que possam apontar novos usos para essas oleaginosas, beneficiando tanto as populações tradicionais que podem garantir uma fonte de renda através desses insumos, quanto a população em geral que pode usufruir dos inúmeros benefícios e aplicações desses óleos.
Se, tradicionalmente, o óleo da andiroba ou de copaíba são conhecidos por suas propriedades fitoterápicas, eles também podem ser importantes insumos para o desenvolvimento de biocurativos, por exemplo. “A Castanha-do-pará é um bom exemplo disso. A gente já faz uso dela, de forma bem difundida no mundo inteiro, como fonte de alimento. Mas, agora, a gente está utilizando para cosméticos e biocurativos”, explica o professor.
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“Nós temos um biocurativo feito com polímero natural e o óleo da Castanha-do-pará. É uma pesquisa que já está bem avançada, a gente tem uma patente depositada com esses óleos e esse biocurativo, e já temos testes bem promissores para a cicatrização. Temos um projeto em andamento com outras instituições, onde a gente vai começar a planejar o uso deles em cirurgias de pequenos animais”.