Projeto “Novas Histórias” promove transformações por meio da educação
Publicado Diário FMem 20/05/2025
Em um cenário onde muitos enxergam apenas punição, o estado do Pará continua a converter o sistema carcerário em espaço de oportunidades reais para quem busca um futuro mais promissor.
O projeto “Novas Histórias”, fruto da parceria entre um grupo educacional e a Secretaria do Estado de Administração Penitenciária (Seap), disponibiliza bolsas de estudo integrais para mulheres custodiadas. Na Unidade de Custódia e Reinserção Feminina (UCRF) de Ananindeua, dez mulheres experimentam uma realidade que contrasta com o estereótipo prisional: todas se tornaram universitárias.
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O projeto, que completou quatro anos de atuação, já formou suas primeiras graduadas e busca mudar as histórias de quem não teve oportunidades anteriormente por meio do acesso à educação superior.
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“Nós já formamos diversas mulheres. Tivemos, no ano passado, a cerimônia de formatura. Mulheres sob custódia, mães de baixa renda, que jamais imaginaram obter um nível superior e, com esse projeto, conseguiram alcançar esse objetivo”, explica a coordenadora da Educação Prisional da Seap, Patrícia Sales.
A iniciativa concede dez bolsas de estudo na modalidade EAD em diversos cursos, com adicional de quatro bolsas integrais ofertadas pela Universidade da Amazônia (Unama). As participantes selecionadas podem optar entre Pedagogia, Licenciatura em Letras, Design de Interiores e Ciências Contábeis.
Primeiras formadas rompem barreiras sociais
Em 2024, o projeto celebrou suas primeiras graduadas: Leilane Barbosa Salles e Rosa Cravo concluíram os cursos de Design de Interiores e Licenciatura em Letras, respectivamente, mesmo sob a condição de internas da UCRF. A conquista simboliza muito mais que um diploma universitário.
“Para mim, representou um privilégio estar neste lugar e receber uma bolsa de estudo, uma graduação completa. Muitas pessoas em liberdade não possuem essa oportunidade que nós recebemos aqui dentro do cárcere”, afirma Cleudiane Moura, outra participante do programa que recentemente concluiu sua graduação em Letras.
Leilane, que agora acumula duas graduações – já possuía formação em pedagogia antes de sua detenção – enfatiza como o programa trouxe propósito em um momento desafiador: “Minha vida não ficou estagnada. Dedico-me aos estudos e me sinto feliz com isso, porque poderei dar continuidade aos meus sonhos.”
Influência familiar e quebra de ciclos negativos
Os benefícios do projeto ultrapassam os muros da prisão. As estudantes descrevem como suas conquistas acadêmicas servem de inspiração para familiares, em especial para seus filhos.
“Eles me consideram um exemplo. Em todas as ocasiões de visita ou quando recebo recados, eles enviam mensagens afirmando que sou motivo de orgulho para eles”, relata Cleudiane, mãe de dois filhos – um formado em engenharia civil e outro em fase final do curso de Educação Física na Universidade do Estado do Pará (Uepa).
A professora Natali Benassuly, pedagoga da UCRF que acompanha a iniciativa desde seu lançamento, confirma este impacto.
“Muitas se tornaram as primeiras universitárias de suas famílias. A partir do envolvimento delas com os estudos, o projeto também motivou outras pessoas privadas de liberdade a concluírem o ensino médio”.
Educação como ferramenta eficaz contra a reincidência criminal
O projeto “Novas Histórias” vem para ajudar a corroborar uma constatação validada por pesquisas científicas: a educação reduz a reincidência criminal.
“Existem dados estatísticos comprovados por artigos científicos, dissertações de mestrado e teses de doutorado que demonstram que as pessoas privadas de liberdade que se dedicam aos estudos não reincidem no crime”, ressalta Benassuly.
Para Patrícia Sales, o diploma funciona como uma porta de acesso à reinserção social efetiva: “Ao deixarem o cárcere com o diploma em mãos, elas encontrarão mais facilidade para se reintegrarem à sociedade, em busca de novas perspectivas, um futuro promissor para si mesmas e seus filhos”.
Superação de obstáculos extraordinários
O ambiente prisional impõe desafios adicionais aos estudos. Rosa Cravo, que progrediu para o regime semiaberto, reflete sobre essa realidade: “Não é simples estudar em liberdade, e no ambiente prisional, as dificuldades se multiplicam. Porém, cada obstáculo enfrentado representa um estímulo para superar aquele desafio”.
A persistência demonstrada pelas participantes inspira outras mulheres sob custódia. No momento atual, outras 60 mulheres da UCRF finalizaram o Ensino Médio e se preparam para o Exame Nacional do Ensino Médio para Pessoas Privadas de Liberdade (Enem PPL), com o objetivo de trilhar percurso semelhante.